A
IMPORTÂNCIA DO JOGO DENTRO DO DESENVOLVIMENTO SÓCIO-COGNITIVO INFANTIL
José
Márcio Carlos[1]
RESUMO
O
estudo proposto para este artigo se prestou a refletir a importância do jogo
dentro do desenvolvimento sócio-cognitivo da criança, isto é, as contribuições
do mesmo para o processo de crescimento e aprimoramento das dimensões sociais e
cognitivas do universo infantil. Como bem se sabe, o conceito “jogo” não se
restringe meramente ao aspecto lúdico, isto é, brincar por brincar . Quer
dizer, ao observar a importância do brincar (jogar) na vida da criança, é
possível notar as transformações que esta atitude influencia estruturalmente as
crianças. E como se verá, sobretudo, com as reflexões de Piaget e Vygotsky, a
criança que brinca ou joga vai construindo capacidades sócio-cognitivas
satisfatórias, tanto a curto ou a longo prazo, visto que o jogo está
intimamente ligado à construção da vida em sociedade e do cognitivo, ou seja,
do ato de aprender. E, acima de tudo, é importante destacar que este
desenvolvimento é sócio-cognitivo, uma vez que estas duas dimensões não podem
ser concebidas separadamente, mas sim em plena conformidade e harmonia, haja
vista que uma depende da outra, e a criança das duas.
PALAVRAS-CHAVE: Jogo, desenvolvimento sócio-cognitivo, lúdico
1.
INTRODUÇÃO
O
ser humano quando nasce descobre um mundo que já tem uma organização, normas
sociais e uma história. A presença dos outros seres humanos ao seu redor
permite-lhe algumas manifestações simbólicas tais como, por exemplo, a
linguagem e o pensamento.
Por
meio da constante interrelação com o mundo nas suas várias facetas, isto é,
família, escola, sociedade e etc, o indivíduo vai construindo a sua
aprendizagem. E esta é uma função integrativa, na qual se relacionam o corpo, a
mente e a psique, a fim de que o mesmo possa apropriar-se da realidade de uma
forma particular.
É
bem verdade que o ato de aprender acontece por meio de uma disposição interior
de quem quer aprender e de quem ensina. E esta dinâmica já é um acontecimento
desde a antiguidade, pois na “(...) antiguidade, a educação acontecia no
cotidiano de cada indivíduo. Por intermédio da convivência como os membros mais
velhos da comunidade, os amigos os vizinhos, as pessoas interiorizavam os
valores e as normas sociais do ambiente em que viviam.” (MOURÃO SÁ, 2006, p.5)
Essa
tradição foi se desenvolvendo ao longo dos tempos até chegar aos grandes
teóricos contemporâneos tais como, por exemplo, Jean Piaget e Vygotsky, os
quais são autores que recordam essa dinâmica da aprendizagem desde os tempos
remotos. Porém, o ato de aprender é amplo, há muitos vieses por onde trilhar.
Tendo ciência disso, a disposição deste artigo é discernir a contribuição dos
jogos para o desenvolvimento sócio-cognitivo infantil, percebendo o seu valor
para a formação da consciência da criança quanto para a significação da vida em
sociedade, fazendo desta, também, um caminho de crescimento cognitivo.
Queremos assim, com a ajudar
de alguns autores, tratar do tema proposto e desenvolvê-lo, sobretudo dando
destaque ao pensamento de Piaget, lembrando também de citar Vygotsky. Daí, pretendemos
perceber a importância dos jogos infantil e como se dá esta relação da criança
com o mesmo, partindo da ideia de que a criança se desenvolve a todo o momento
mediante a prática do jogo, o qual reforça seu lado social e aperfeiçoa seu
cognitivo, sua capacidade de aprender.
2.
REVISÃO DA LITERATURA: AS CONCEPÇÕES DO JOGO
2.1.
A CONCEPÇÃO DE JOGO EM VYGOTSKY
Vygotsky estabelece uma
relação estreita entre o jogo e a aprendizagem, atribuindo-lhe uma grande
importância. O centro da sua proposta reflexiva resulta no fato de que o
desenvolvimento cognitivo resulta da interação entre a criança e as pessoas com
quem mantém contatos regulares. E para que possamos melhor compreender essa
importância é necessário que recordemos algumas idéias de sua teoria do desenvolvimento
sócio-cognitivo.
O principal conceito da
teoria de Vygotsky é o de “Zona de Desenvolvimento Proximal”, na qual ele
explicita o valor da experiência social no desenvolvimento cognitivo infantil
(Cf. OLIVEIRA, p.44). Ele se refere à distância entre o nível de
desenvolvimento atual, determinado através da solução de problemas pela
criança, sem ajuda de alguém mais experiente, e o nível potencial de
desenvolvimento medido por meio da solução de problemas sob a orientação de
adultos ou de crianças mais experientes. As interações da criança com as
pessoas de seu ambiente desenvolvem-lhe, pois, a fala interior, o pensamento
reflexivo e o comportamento voluntário (Cf. Vygotsky, 1984, p. 101).
No desenvolvimento, a imitação e o ensino
desempenham um papel de primeira importância. Põem em evidência as qualidades
especificamente humanas do cérebro e conduzem a criança a atingir novos níveis
de desenvolvimento. A criança fará amanhã sozinha aquilo que hoje é capaz de
fazer em cooperação.
Por conseguinte, o único tipo correto de pedagogia é aquele
que segue em avanço relativamente ao desenvolvimento e o guia; deve ter por
objetivo não as funções maduras, mas as funções em vias de maturação (Vygotsky,
1979, p.138).
Particularmente, o
surgimento de um mundo ilusório e imaginário na criança é o que, na visão de
Vygotsky, se constitui o jogo. Quer dizer, ele nasce com a aparição do
simbolismo. A chave para toda a função simbólica da brincadeira infantil é,
portanto, a utilização de alguns objetos como brinquedos e a possibilidade de
executar com eles um gesto representativo (Cf. Vygotsky, 1984, p.122).
Vale observar que não é o
caráter de espontaneidade do jogo que o torna uma atividade importante para o
desenvolvimento da criança, mas sim o exercício no plano da imaginação, da
capacidade de planejar, imaginar situações diversas, representar papéis e situações
do cotidiano, bem como o caráter social das situações lúdicas, os seus
conteúdos e as regras inerentes à cada situação.
Também não é todo jogo da
criança que possibilita a criação de uma Zona de Desenvolvimento Proximal, do
mesmo modo que nem todo o ensino o consegue. Porém, no jogo simbólico,
normalmente, as condições para que ela se estabeleça estão presentes, haja
vista que nesse jogo estão presentes uma situação imaginária e a sujeição a
certas regras de conduta. As regras são partes integrantes do jogo simbólico,
embora, não tenham o caráter de antecipação e sistematização como nos jogos
habitualmente "regrados".
Ao desenvolver um jogo
simbólico, a criança ensaia comportamentos e papéis, projeta-se em atividades
dos adultos, ensaia atitudes, valores, hábitos e situações para os quais não
está preparada na vida real, atribuindo-lhes significados que estão muito
distantes das suas possibilidades efetivas.
A atuação nesse mundo
imaginário cria uma Zona de Desenvolvimento Proximal formada por conceitos ou
processos em desenvolvimento.
Podemos sintetizar dizendo que: a regra e a situação imaginária caracterizam o conceito de jogo infantil para Vygotsky.
Podemos sintetizar dizendo que: a regra e a situação imaginária caracterizam o conceito de jogo infantil para Vygotsky.
A
criação de uma situação imaginária constitui, assim, a primeira manifestação da
criança em relação às restrições situacionais. Ela possibilita que a criança
opere com um significado alienado numa situação real e que renuncie aos seus
impulsos imediatos, subordinando-se a determinadas regras. O atributo essencial
na brincadeira é que uma regra torna-se um desejo, ou seja, satisfazer as
regras torna-se uma fonte de prazer, o que, no futuro, constituirá o nível
básico de ação real e moralidade do indivíduo (Cf. Vygotsky, 1984, p.
113-114).
O autor também detecta no
jogo outro elemento a que atribui grande importância: o papel da imaginação que
coloca em estreita relação com a atividade criadora (Vygotsky, 1999). Ele
afirma que os processos de criação são observáveis principalmente nos jogos da
criança, porque no jogo ela representa e produz muito mais do que aquilo que
viu.
Todos
conhecemos o grande papel que nos jogos da criança desempenha a imitação, com
muita freqüência estes jogos são apenas um eco do que as crianças viram e
escutaram aos adultos, não obstante estes elementos da sua experiência anterior
nunca se reproduzem no jogo de forma absolutamente igual e como acontecem na
realidade. O jogo da criança não é uma recordação simples do vivido, mas sim a
transformação criadora das impressões para a formação de uma nova realidade que
responda às exigências e inclinações da própria criança. (Vygotsky, 1999, p.12).
2.2.
A CONCEPÇÃO DE JOGO EM JEAN PIAGET
Para Piaget, o jogo possui estreita relação com a construção da
inteligência, ressaltando que o prazer que resulta do jogo espontâneo motiva a
aprendizagem. O jogo, enquanto atividade lúdica, constitui-se de um caráter
educativo tanto na área da psicomotricidade quanto na área afetivo-social,
auxiliando na formação de valores como a perseverança, a honestidade e o
respeito.
Nesta concepção, os jogos consistem numa assimilação funcional,
num exercício de ações individuais já aprendidas, consolidando assim os
esquemas já formados. Piaget classifica os jogos em três tipos. Contudo, os
veremos no tópico seguinte.
O estágio sensório-motor representa a forma inicial do jogo na
criança. Nos diz Piaget:
Ao cabo do
período sensório-motor (...) surge uma função fundamental para a evolução das
condutas ulteriores, que consiste em poder representar alguma coisa (um
“significado” qualquer: objeto, acontecimento, esquema conceptual etc.) por
meio de um “significante” diferenciado e que só serve para essa representação:
linguagem, imagem mental, gesto simbólico etc (PIAGET E INHELDER, 1980, p. 46).
Quando a criança toma consciência de suas novas capacidades, cada
nova aprendizagem que faz, ela volta a utilizar os jogos que acabam por formar
novos esquemas de ação ou de conduta. O jogo de exercício caracteriza-se pelo
puro prazer que, por sua vez, traz um significado a ação.
Apesar destes jogos aparecerem nos primeiros anos de vida, eles
reaparecem durante toda a infância e muitas vezes até na idade adulta.
Refere-se ao período pré-operatório dos dois aos sete anos aproximadamente.
Nesta fase a criança ainda encontra o mesmo prazer dos jogos anteriores, porém neste momento ela passa a usar os símbolos.
Refere-se ao período pré-operatório dos dois aos sete anos aproximadamente.
Nesta fase a criança ainda encontra o mesmo prazer dos jogos anteriores, porém neste momento ela passa a usar os símbolos.
Daí podemos ter mais clareza quando Piaget diz: “O jogo simbólico
assinala, sem dúvida, o apogeu do jogo infantil” (PIAGET E INHELDER, 1980, p.
51). Porque os jogos simbólicos permitem a assimilação do mundo exterior ao
“eu” da criança. Diante disso, Piaget faz-nos a seguinte ressalva:
É, portanto, indispensável ao seu
equilíbrio afetivo e intelectual que possa dispor de um setor de atividade cuja
motivação não seja a adaptação ao real senão, pelo contrário, a assimilação do
real pelo eu, sem coações nem sanções: tal é o jogo, que transforma o real por
assimilação mais ou menos pura às necessidades do eu, ao passo que a imitação
(quando constitui fim em si mesma) é acomodação mais ou menos pura aos modelos
exteriores e a inteligência é equilíbrio entre a assimilação e a acomodação
(PIAGET E INHELDER, 1980, p. 52).
Há então a presença do “faz-de-conta”, no qual a criança utiliza
outros objetos para simbolizar que está comendo, ou dormindo, ou fazendo
qualquer outra atividade. Ao se tratar, por exemplo, da observação de uma briga
entre seus pais, quando for jogar, a criança poderá resolver esta briga através
das suas representações. Quando ela utiliza os jogos simbólicos, tem a
capacidade de, ao vivenciar aspectos de sua realidade, fazer elaborações
mentais e projetar isso ao jogar. Com isso, a visão de mundo dela vai sendo
paulatinamente elaborado.
Os jogos simbólicos apresentam uma evolução até a criança chegar
aos sete anos de idade. Nos primeiros anos desta fase, ou seja, dos dois aos
quatro anos aproximadamente, a criança utiliza seu próprio corpo para fazer as
representações que deseja, como, por exemplo, imitar animais, no caso do gato
ela se ajoelha ficando em quatro apoios e imita o som do gato.
Ao se aproximar dos sete anos, onde surge o pensamento intuitivo,
os jogos passam a ter uma representação mais “fiel” da realidade. Ai a criança
busca coerência nas palavras, no ambiente e na ação, ou seja, ela não vai, por
exemplo, ao brincar, colocar uma boneca muito grande dentro de um berço
pequeno, pois sabe que isto não será possível. Daí ser possível perceber que o
símbolo substituiu o exercício, o que fará agora com que a regra substitua o símbolo.
Neste momento, a criança alcançou a capacidade de reversibilidade
do pensamento operatório concreto. Além disso, há a necessidade dela trabalhar
com a atenção, concentração, raciocínio e a sorte.
E para haver regras, supõe-se a existência de no mínimo dois
indivíduos envolvidos, e estas regras podem ser transmitidas ou espontâneas.
As regras transmitidas são as que procedem de outras gerações. As espontâneas provêm dos jogos momentâneos.
As regras transmitidas são as que procedem de outras gerações. As espontâneas provêm dos jogos momentâneos.
Por fim, para Piaget, o jogo se caracteriza, principalmente, por
ser lúdico; a assimilação predomina a acomodação; estruturar-se pela
organização mental e as regras aparecerem com a socialização da criança.
2.3.
OS TIPOS DE JOGOS
É bem certo que, dentre os
principais tipos de jogo, podemos mencionar o jogo de exercício, por caracterizar
o período sensório-motor; o jogo simbólico, que tem o seu apogeu durante a
etapa pré-operatória; e o jogo de regras, que começa por volta dos 6 ou 7 anos
e vai se prolongando até o início da adolescência. (Cf. DELVAL, 1998, p.90).
Na visão de Piaget (1978), as origens das manifestações
lúdicas acompanham o desenvolvimento da inteligência vinculando-se aos estágios
do desenvolvimento cognitivo. Cada etapa do desenvolvimento está relacionada a
um tipo de atividade lúdica que se sucede da mesma maneira para todos os
indivíduos.
Ao identificar três grandes tipos de
estruturas mentais que surgem sucessivamente na evolução do brincar infantil,
vale comentá-los, a fim de perceber as suas importâncias:
O
jogo de exercício
Representa a forma inicial do jogo na
criança e caracteriza o período sensório-motor do desenvolvimento cognitivo.
Manifesta-se na faixa etária de zero a dois anos e acompanha o ser humano
durante toda a sua existência — da infância à idade adulta.
A característica principal do jogo de
exercício é a repetição de movimentos e ações que exercitam as funções tais
como andar, correr, saltar e outras pelo simples prazer funcional.
O jogo
simbólico
Tem início com o aparecimento da função
simbólica, no final do segundo ano de vida, quando a criança entra na etapa
pré-operatória do desenvolvimento cognitivo. Um dos marcos da função simbólica
é a habilidade de estabelecer a diferença entre alguma coisa usada como símbolo
e o que ela representa seu significado.
O
jogo de regras
Constituem-se os jogos do ser socializado e
se manifestam quando, por volta dos 4 anos, acontece um declínio nos jogos
simbólicos e a criança começa a se interessar pelas regras. Desenvolvem-se por
volta dos 7/11 anos, caracterizando o estágio operatório-concreto.
Convém também destacar a
brincadeira do Faz-de-conta ou, na visão de Vygotsky, chamado de “jogo
imaginário e representativo das crianças” (Cf. NEGRINE, 1995, p.18), pois é o
Lugar do Simbolismo, da Representação, do Imaginário.
Para Piaget (1978), quando
brinca, a criança assimila o mundo à sua maneira, sem compromisso com a
realidade, pois sua interação com o objeto não depende da natureza do objeto,
mas da função que a criança lhe atribui. É o que Piaget chama de jogo
simbólico, o qual se apresenta inicialmente solitário, evoluindo para o estágio
de jogo sócio-dramático, isto é, para a representação de papéis, como brincar
de médico, de casinha, de mãe etc.
O apogeu
do jogo simbólico situa-se entre 2 e 4 anos de idade, declinando a partir daí.
Envolvendo duas criança de 4 anos num balanço: uma age “como se” estivesse em
um avião e precisasse mudar os planos de vôo porque tem pouca gasolina. E a
outra está apenas tentando se balançar buscando adquirir confiança para ir o
mais alto que pudesse. Com isso, nota-se que há um contraste entre esse tipo de
jogo, tanto num viés do faz-de-conta quanto no brincar de uma criança que
simplesmente se balança o mais alto que pode em um balanço.
A
primeira criança, de acordo com Piaget, estaria introduzindo elementos de “como
se” e graus de fantasia, os quais estariam modificando a situação, enquanto a
outra, na sua brincadeira, estaria apenas procurando dominar dificuldades.
A maior
parte dos jogos de faz-de-conta envolve transações interpessoais, eventos e
aventuras que englobam outras características e situações no espaço e no tempo.
O jogo imaginativo acontece com pares ou grupos de crianças que introduzem
objetos inanimados, pessoas e animais que não estão no momento.
3.
COMPRENDENDO O DESENVOLVIMENTO SÓCIO-COGNITIVO
3.1.
SIGNIFICANTE E SIGNIFICADO: INÍCIO DA REPRESENTAÇAO INFANTIL
Falar
sobre significante e significado é, antes de qualquer coisa, perceber que estes
se dão no contexto em que a capacidade de representação da criança começa a
surgir muito gradativamente, embora ainda não se possa falar claramente em
representação. “Ao longo do período sensório-motor a criança consegue
progressos na área do conhecimento do mundo e do desenvolvimento da sua
inteligência, mas encontra-se ainda limitada a agir diretamente sobre as coisas
(...)” (DELVAL, 1998, p.87).
A
representação permite agir sobre a realidade não de forma direta, e sim
imediata. E ela vai se dá ao final do período sensório-motor. Consiste em fazer
uma alusão ou uma evocação de um objeto ou acontecimento que não está presente,
por meio de outra coisa. Esse agir abrirá grandes possibilidades para o
desenvolvimento do indivíduo, visto que se dará uma ampliação da sua capacidade
de agir sobre as coisas, uma vez que não se precisará de fazê-lo,
necessariamente, de forma material, já que também será possível agir de forma
simbólica. (Cf. DELVAL, 1998, p. 87)
Os
antecedentes da capacidade representativa devem ser encontrados nas situações
em que a criança, a partir de um aspecto de uma determinada realidade, é capaz
de reconhecer outros aspectos ou o conjunto da mesma. Utiliza-se de um
“significante” para designar algo diferente, próximo ou idêntico, que é o
significado.
3.2.
OS TIPOS DE SIGNIFICANTES
É
bem certo que nem todos os significantes são do mesmo tipo e, neste sentido,
podem ser classificados de acordo com o grau de conexão existente entre
significante e significado. Desse modo, podemos distingui-los em três tipos,
conforme nos ajuda a discernir o comentador Juan Delval (1998, p.88):
O
primeiro tipo se dá quando o significante e o significado não estão
diferenciados, daí falamos em índices ou de sinais. Por exemplo: fumaça é sinal
de fogo, ou um ruído em uma determinada sala próxima é um indício da presença
de alguém se aproximando. Neste contexto não há nada mais do que uma associação
entre significante e significado. E não se fala propriamente ainda em
representação.
No
segundo tipo, o significante se diferencia do significado, porém mantém uma
conexão com ele. Por isso, fala-se de símbolos. Desse modo, por exemplo, um
pedaço de pau sobre o qual um menino monta simboliza um cavalo, semelhança essa
reside no fato da possibilidade de montá-lo e deslocar-se. A balança simbolizar
a justiça pelo seu equilíbrio; um desenho de uma casa simbolizar uma
determinada casa.
Já
no terceiro e último tipo, os signos são significantes totalmente diferenciados
dos seus significados. Um exemplo disso são as palavras da linguagem: entre a
palavra “porta” e uma porta não existe nenhuma relação, haja vista que em
diferentes línguas são usadas diferentes palavras (os signos são arbitrários);
os erradamente denominados símbolos matemáticos: não há relação também entre o
signo “+” e a operação de adição.
Por
fim, diante destes três tipos de significantes ante o seu significado,
percebe-se que há uma escala de maturidade, ou seja, conforme uma criança for
se desenvolvendo e ampliando seus conhecimentos dentro do contexto de mundo,
favorecido pela convivência em sociedade, mais amadurecerá suas capacidades
cognitivas e saberá distinguir tanto as regras individuais, particulares quanto
as regras coletivas, que requerem conhecimento de mundo.
4.
A LUDICIDADE E SUA COLABORAÇAO PARA O DESENVOLVIMENTO SÓCIO- COGNITIVO INFANTIL
Kishimoto
(2000) defende que a brincadeira e o jogo interferem diretamente no desenvolvimento
da imaginação, da representação simbólica, da cognição, dos sentimentos, do
prazer, das relações, da convivência, da criatividade, do movimento e da
auto-imagem dos indivíduos.
O ato
de brincar é de grande valor na construção do conhecimento, por permitir que a
criança explore seu mundo interior e descubra os elementos externos em si,
exercite a socialização e adquira qualidades fundamentais para seu
desenvolvimento físico e mental.
Toda
criança deve brincar, pois é através da brincadeira que a criança atribui sentido
ao seu mundo, se apropria dos conhecimentos que a ajudarão a agir sobre o meio
em que ela se encontra. Em alguns momentos ela vai reproduzir, em suas
brincadeiras, situações que presenciou em seu meio.
Contudo,
Brougère (2001, p. 99) lembra que “brincadeira é uma mutação do sentido, da
realidade: as coisas tornam-se outras. É um espaço à margem da vida comum, que
obedece a regras criadas pela circunstância”. Para Winnicott (1982), é no brincar,
e talvez apenas no brincar, que a criança ou adulto fluem sua liberdade de
criação. Mesmo as mais simples brincadeiras, aquelas que todo mundo faz com
bebês, são estímulos importantes para o desenvolvimento infantil.
A
experiência lúdica se alimenta continuamente de elementos que advêm da cultura em
geral. Essa influência se dá de várias formas e começa com o ambiente e as
condições materiais. O que dizem e o que fazem os adultos a respeito dessa
atividade, bem como o espaço, o tempo e os materiais colocados à disposição das
crianças (na cidade, nas moradias e nas escolas), são aspectos que vão ter
papel fundamental para o desenvolvimento da experiência lúdica.
A forma
de comunicação própria da brincadeira pressupõe um aprendizado com consequências
sobre outros aprendizados, pois permite abrir possibilidades de distinção entre
diferentes tipos de comunicação: reais, realistas, fantasiosas. A criança,
quando brinca, entra num mundo de comunicações complexas que vão ser utilizadas
no contexto escolar, nas simulações educativas, nos exercícios. Nesse sentido,
é extremamente importante distinguir os diferentes tipos de atividade que podem
e devem ter seu lugar garantido no contexto escolar.
Entende-se
que a atividade lúdica, sobretudo, na educação infantil não é um mero
passatempo, ela ajuda no desenvolvimento integral das crianças, promovendo
processos de socialização e descoberta do mundo. A criança tem dentro de si
potencial e este emerge nas situações de sua vida, principalmente, nas
brincadeiras interativas, são nestes momentos, que o indivíduo apresenta ao
mundo seu ritmo e sua harmonia. A brincadeira nada mais é do que a linguagem da
criança.
Sendo
assim, a ludicidade tem uma importância fundamental para o desenvolvimento e
aprendizagem das crianças. O ato de brincar tem um grande valor para que a criança
explore o mundo e construa conhecimento.
CONCLUSÃO
Chegado ao término de nossos prévios esforços, na
tentativa de explanar o mais claro e sinteticamente o tema proposto para este
artigo, desejamos enfatizar algumas ideias que ficaram desta reflexão, ainda
que parcialmente, uma vez que o tema não está fechado ou acabado.
Fundamentalmente,
fica evidente afirmamos que o jogo é uma ferramenta essencial na formação
integral da criança, sobretudo no que concerne aos aspectos social e cognitivo.
Ao interagir com o jogo e no jogo, a criança tende a aprender, aprimorar e a
expandir as suas capacidades de convivência social e crescimento intelectual.
Embora
haja autores que reflitam a relação entre a criança e as dimensões
sócio-cognitivas, cada qual, por um determinado e diferente ponto de vista, é
unânime em afirmar o valor e a importância do jogar ou brincar para a fase
infantil em sua plenitude. Isso porque não vêem o jogar ou brincar como um mero
ato lúdico em si mesmo, mas fazem uma leitura mais ampla deste contexto, visto
que esta atividade tão prazerosa e, em determinada fase da infância, tão
desafiadora, sobretudo com a presença das regras, traz benefícios formativos e
estruturais para o crescimento da criança.
Neste
sentido, esta empreitada se tornara um labor tão necessário, pois ao meditarmos
os diversos contextos em que a criança se porta mediante o jogar ou brincar,
principalmente se relacionando diretamente com o objeto do jogo e agregados,
podemos notar o quanto mais precocemente a criança já se inserir no mundo do
jogo, mais ela terá condições de se desenvolver sadiamente e passo por passo,
sem correr riscos de queimar etapas, uma vez que o jogo traz consigo também o
aspecto do crescimento gradativo.
Jogar
é preciso. Ousemos incentivar e também jogar, não importando a idade, porque a
socialização e a aprendizagem cognitiva não tem limites.
[1] CARLOS, José Márcio. Graduado em
Filosofia pela Faculdade Arquidiocesana de Mariana “Dom Luciano”. Pós-graduado em Psicopedagogia Clínica e Institucional pela EVaTA, em Viçosa-MG.